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Compra de imóvel ainda tem risco

Daniela D Ambrosio Quando a crise atinge um setor como o de construção civil, é quase inevitável a imediata associação com o trágico caso Encol. Embora pontual, a delicada situação de algumas empresas começa a suscitar uma dúvida: as obras já iniciadas têm risco de parar? Dez anos depois de decretada a falência da Encol, o setor imobiliário vive uma fase completamente distinta. Assim como o próprio mercado, os mecanismos de proteção aos compradores se sofisticaram. Hoje, cada empreendimento tem uma contabilidade separada. Um avanço e tanto. Mas a principal blindagem do setor, o chamado patrimônio de afetação - instrumento legal que dá mais garantias ao comprador em casos extremos, como a falência - ainda é pouco usada pelas empresas.Por exigência dos bancos, que também foram prejudicados pela falência da Encol, praticamente todas as empresas adotam as SPEs (Sociedades de Propósito Específico). A SPE é uma empresa criada para cuidar de um único empreendimento. Com vida curta, nasce no momento da compra do terreno e é desfeita depois da entrega das chaves. Nessas sociedades, não há contaminação das contas da empresa ou de um outro empreendimento com problemas."É um bom instrumento, que garante a segregação dos ativos", afirma André Viola Ferreira, sócio da Terco Grant Thornton, empresa que audita a maioria dos balanços das companhias do setor. As sociedades específicas também são muito usadas por conta das parcerias entre empresas do setor imobiliário. As companhias se associam apenas naquele empreendimento.Quando a SPE já era realidade dentro das empresas, em agosto de 2004 entrou em vigor uma lei específica (10.931/2004) - do patrimônio de afetação. Mas trata-se de uma lei facultativa, cuja adoção fica a critério do incorporador. "Como muitas companhias já tinham o hábito de criar as SPEs, que também segrega o patrimônio, poucas empresas a adotaram", afirma o advogado Rodrigo Bicalho, sócio do Bicalho Molica Advogados. "O uso está aumentando, mas proporcionalmente no mercado ainda é pequeno", observa.A adoção de um mecanismo não exclui o outro. O mesmo empreendimento pode ser duplamente blindado. Geralmente, os bancos exigem um ou outro para concessão de empréstimo. Especialistas são unânimes em afirmar que tanto a SPE, quanto o patrimônio de afetação são um avanço importante e garantem segurança ao comprador. A diferença entre ambos aparece em situações extremas, como a falência. O patrimônio de afetação não entra na massa falida. "A SPE é uma filial da empresa, integra o patrimônio da incorporadora e entra na massa falida", explica Alexandre Laizo Clápis, sócio da área imobiliária do Machado, Meyer, Sendacz e Opice. "A proteção absoluta para o comprador é o patrimônio de afetação", diz ele.Quando um empreendimento está "afetado", como diz o jargão jurídico, em caso de paralisação da obra, os compradores podem vender as unidades restantes para continuar o projeto ou o próprio terreno, além de assumir a obra e contratar uma outra construtora. Para que isso aconteça numa SPE, é necessário que o juiz determine. "Mas vale lembrar que, no caso Encol, o juiz tirou várias obras da massa falida e permitiu que os condôminos tocassem sozinhos", afirma Luiz Rogélio Tolosa, diretor de relações com investidores da Brascan Company. A Company foi uma das primeiras empresas a adotar o patrimônio de afetação.O diretor de finanças corporativas da Even, Eduardo Cytrinowicz, lembra que, se há financiamento bancário em uma SPE, a instituição financeira terá todo interesse em concluir a obra.A burocracia ainda é um argumento usado contra o patrimônio de afetação. Esse mecanismo de proteção exige que a empresa preste contas detalhadas trimestralmente a uma comissão de compradores. "As empresas temem que um grupo sem conhecimento ou que atue de má-fé possa ter acesso privilegiado a informações importantes ou uma ingerência muito grande sobre a obra", diz o advogado Rodrigo Bicalho. Mas as empresas que já adotam o modelo dizem que não há problemas com os compradores. "Temos mais de 50 prédios com comissão de representantes e não vemos problema algum", diz Tolosa. "A lei foi feita para ser usada em um momento de estresse, não afeta o dia-a-dia", afirma. Informações mais estratégicas, como o valor pago na contratação de serviços e compra de materiais, não costumam ser fornecidas pelas companhias.Para estimular a adoção, já que a lei é facultativa, o governo estabeleceu uma tributação diferenciada - de 7% sobre o faturamento da obra. Mas não é exatamente uma vantagem, já que a SPE pode adotar o lucro presumido e ser tributada entre 6,5% e 6,7%. O patrimônio de afetação passa a ser mais vantajoso, porém, em projetos maiores, com valor geral de vendas acima de R$ 48 milhões, que passam a ser tributados sobre o lucro real.O patrimônio de afetação não é usado como argumento de vendas, simplesmente porque a grande maioria dos consumidores desconhece a vantagem. O mecanismo começa a ser adotado por um número maior de empresas, mas ainda está restrito a determinados projetos É o que ocorre na Cyrela, PDG Realty, e JHSF, que usou o modelo no Cidade Jardim, que reúne shopping, prédio residencial e comercial. O Seridó 106, imóvel de altíssimo padrão da construtora São José e Klabin Segall também. A mineira MRV começou a fazer em alguns empreendimentos e agora vai expandir para todas as obras.


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