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DOU

SOLUÇÃO DE CONSULTA INTERNA COSIT Nº 18, DE 8 DE AGOSTO DE 2013

IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA ­ IRPJ LUCROS AUFERIDOS POR EMPRESAS COLIGADAS OU CONTROLADAS DOMICILIADAS NO EXTERIOR

Origem COORDENAÇÃO­GERAL DE PROGRAMAÇÃO E ESTUDOS

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA ­ IRPJ LUCROS AUFERIDOS POR EMPRESAS COLIGADAS OU CONTROLADAS DOMICILIADAS NO EXTERIOR

A aplicação do disposto no art. 74 da Medida Provisória nº 2.158­35, de 2001, não viola os tratados internacionais para evitar a dupla tributação.

Dispositivos Legais: art. 98 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, arts 25 e 26 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, arts. 21 e 74 da Medida Provisória nº 2.158­35, de 24 de agosto de 2001, e Artigo 7 da Convenção­Modelo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Relatório

(e­processo 10166.730764/2012­36)

Cuida­se de examinar a Consulta Interna nº 4, de 7 de dezembro de 2012, sobre a compatibilidade de aplicação do art. 74 da Medida Provisória (MP) nº 2.158­35, de 24 de agosto de 2001, com o disposto nos acordos para evitar a dupla tributação celebrados pelo Brasil

2.  Observa­se, em síntese, que o art. 74 da MP nº 2.158­35, de 2001, prevê a tributação no Brasil de lucros auferidos por intermédio de coligadas e controladas no exterior, na data do balanço no qual tiverem sido apurados.

3.  Por outro lado, os acordos para evitar a dupla tributação celebrados pelo Brasil, dispõem de regras específicas sobre a tributação de lucros, segundo o Artigo 7 da Convenção­Modelo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

4.  Segundo a consulente, existe corrente doutrinária que entende haver incompatibilidade entre a aplicação da norma brasileira de tributação de lucros no exterior obtidos por intermédio de coligadas e controladas e os acordos para evitar a dupla tributação celebrados pelo Brasil.

5.  Afirma que tal entendimento tem por base a Convenção­Modelo da OCDE e foi construído alegando­se, em síntese, que:

“2.1. conforme parágrafo 1º do art. 7º da Convenção­Modelo da OCDE, os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado, a não ser que a empresa exerça, sua atividade no outro Estado Contratante, por meio de um estabelecimento permanente ali situado. Se a empresa exerce suas atividades na forma indicada, seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem atribuíveis àquele estabelecimento permanente; e

2.2. a teor do art. 98 do CTN, os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.”

6.  A consulente aduz que a norma brasileira de tributação de lucros no exterior é compatível com os acordos celebrados pelo Brasil, e fundamenta o seu entendimento no fato de que a tributação de lucros no exterior trata da possibilidade de o Estado Brasileiro tributar o resultado de empresa domiciliada no Brasil em função de sua renda obtida por intermédio de sua participação em sociedades domiciliadas no exterior, e que, portanto, a União pode exigir o Imposto sobre a Renda e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre os lucros que empresas brasileiras auferirem no exterior, na proporção de sua participação societária.

7.  Ressalta que “a norma interna incide em contribuinte brasileiro, inexistindo qualquer conflito com os dispositivos do tratado que versam sobre a tributação de lucros. As disposições dos tratados não visam a limitar o direito de um Estado tributar contribuinte com domicílio em seu próprio território, mas sim regular situações quando possa haver pretensão de tributar­se renda em contribuinte de outro Estado contratante”.

8.  O presente Parecer visa a esclarecer a aplicação do art. 74 da MP nº 2.158­35, de 2001, quando da existência de acordo celebrado pelo Brasil para evitar a dupla tributação, os quais usualmente têm como base a Convenção­Modelo da OCDE.

Fundamentos

9.  Em princípio, cabe observar que a Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, aboliu o princípio da territorialidade no que concerne ao Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas e adotou o princípio da universalidade que determina a tributação dos lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior.

10.  Os arts 25 e 26 da Lei nº 9.249, de 1995, determinam que os lucros apurados pelas controladas e coligadas no exterior sejam oferecidos à tributação pela controladora ou coligada sediada no Brasil e a compensação do imposto incidente no exterior com o imposto devido no Brasil sobre esses mesmos lucros:

“Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano.

(...)

Art. 26. A pessoa jurídica poderá compensar o imposto de renda incidente, no exterior, sobre os lucros, rendimentos e ganhos de capital computados no lucro real, até o limite do imposto de renda incidente, no Brasil, sobre os referidos lucros, rendimentos ou ganhos de capital.(...)”

11.  Enquanto os rendimentos e ganhos de capital correspondem a atividade da empresa brasileira exercida diretamente no exterior, os lucros decorrem de uma participação em controladas e coligadas no exterior.

12.  No que diz respeito à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), o princípio da universalidade também foi adotado a partir da edição da MP nº 2.158­35, de 2001, conforme a seguir transcrito:

“Art. 21. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior sujeitam­se à incidência da CSLL, observadas as normas de tributação universal de que tratam os arts. 25 a 27 da Lei nº 9.249, de 1995, os arts. 15 a 17 da Lei nº 9.430, de 1996, e o art. 1º da Lei nº 9.532, de 1997.

Parágrafo único. O saldo do imposto de renda pago no exterior, que exceder o valor compensável com o imposto de renda devido no Brasil, poderá ser compensado com a CSLL devida em virtude da adição, à sua base de cálculo, dos lucros oriundos do exterior, até o limite acrescido em decorrência dessa adição.”

13.  As disposições contidas nos arts. 25 e 26 da Lei nº 9.249, de 1995, e alterações posteriores determinam o tratamento fiscal de lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos a partir de 1º de janeiro de 1996 e, consequentemente, revogaram a legislação anterior referente à matéria.

14.  O art. 74 da MP nº 2.158­35, de 2001, uniformizou o conceito de disponibilização dos lucros apurados no exterior para coligadas e controladas, considerando­os como disponibilizados para a empresa brasileira na data do balanço no qual forem apurados, seguindo o modelo previsto, na Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, para as filiais e sucursais.

“Art. 74. Para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na forma do regulamento.

Parágrafo único. Os lucros apurados por controlada ou coligada no exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorrida, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na legislação em vigor.”

15.  Conforme a Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, os investimentos em coligadas e controladas devem ser avaliados pelo Método da Equivalência Patrimonial (MEP).

O MEP consiste em atualizar o valor contábil do investimento ao valor equivalente à participação societária da sociedade investidora no patrimônio líquido da sociedade investida e no reconhecimento dos seus efeitos na demonstração do resultado do exercício. Portanto, o valor do investimento é determinado mediante a aplicação da porcentagem de participação no capital social, sobre o patrimônio líquido de cada sociedade coligada ou controlada.

16.  Ao registrar contabilmente o resultado da equivalência patrimonial, a investidora reconhece a parcela dos lucros de suas coligadas e controladas. Sendo assim, verifica­se o acréscimo patrimonial correspondente a sua participação no lucro total das investidas.

17.  Ressalte­se que o art. 74 da MP nº 2.158­35, de 2001, se aplica a investimentos avaliados pelo MEP, pois só se pode falar de disponibilidade econômica e acréscimo patrimonial, decorrente de lucro apurado na investida, mas ainda não pago ao investidor, se esse investimento for avaliado pela equivalência patrimonial ­ já que no caso de investimentos avaliados pelo custo de aquisição, só há disponibilidade econômica após o recebimento de lucros ou dividendos pela investidora.

18.  Nesta mesma linha, o Ministro Dias Toffoli se manifestou no Recurso Extraordinário nº 541.090 ­ SC, nos seguintes termos: 

“Essa avaliação dos investimentos relevantes se dá pelo chamado Método de Equivalência Patrimonial (MEP), por força do art. 248 da Lei das Sociedades Anônimas. Para fins societários, a partir do MEP, o lucro auferido pela coligada/controlada estrangeira é automaticamente registrado no balanço societário da coligada/controlada brasileira. A eventual distribuição desses lucros é irrelevante para se verificar o real crescimento do lucro líquido da brasileira, considerado o regime de competência”.

“Dessa forma, inegável que o acréscimo patrimonial obtido a partir do ajuste do valor do investimento permanente é renda da empresa brasileira, tanto assim que pode ser verificado a partir do método da equivalência patrimonial positiva, com consequências comerciais no balanço da empresa brasileira...”

“Observe­se, ademais, que, por expressa disposição do art. 197 da Lei das Sociedades Anônimas, há a possibilidade de distribuição de dividendos aos acionistas de receita advinda da equivalência patrimonial positiva, ainda que não tenha havido a disponibilidade financeira.

É evidente que só estão sujeitos à tributação no momento do registro contábil os lucros relevantes apurados pelo método da equivalência patrimonial, tendo em vista que a empresa no exterior possui outros investimentos sujeitos à avaliação, pelo denominado método de custo, os quais estão sujeitos ao regime de caixa...”

18.1.  Também transcreveu o voto do Ministro Cezar Peluso no mesmo sentido:

“6.3. Em resumo, as variações dos investimentos sujeitos à equivalência patrimonial repercutem no resultado (lucro ou prejuízo) da controladora/coligada já no exercício em que apuradas no exterior, ao passo que, nos investimentos sujeitos à avaliação e reajuste pelo regime de custo, a repercussão somente se dá por ocasião do recebimento da distribuição do lucro ou dividendo.

(...)

No caso, tem­se a mesma sistemática. Em relação aos investimentos sujeitos à avaliação pelo método de custo, o lucro produzido pela empresa no exterior é virtual em relação à empresa nacional até o momento em que seja efetivamente pago ou creditado, pois submisso ao regime de caixa. Enquanto aos investimentos sujeitos ao método de avaliação pela equivalência patrimonial, o lucro revelado no exterior repercute no resultado da empresa brasileira no mesmo exercício em que se produziu, independentemente de pagamento ou crédito, pois vinculados ao regime de competência.

No momento em que forem distribuídos os lucros relativos aos investimentos sujeitos ao método de avaliação pela equivalência patrimonial, o resultado da empresa no Brasil não será modificado, de modo que não se pode cogitar de tributação.”19.  Em sendo assim, a princípio, não poderia haver lançamento de IRRF por pagamento sem causa ou a beneficiário não identificado. A aplicação do art. 61 está reservada para aquelas situações em que o Fisco prova a existência de um pagamento sem causa ou a beneficiário não identificado.

19.  Os lucros das investidas avaliadas pelo MEP, antes mesmo de serem efetivamente distribuídos, representam um acréscimo patrimonial para a investidora uma vez que já podem ser pagos aos seus acionistas. Isso se deve ao fato de a Lei nº 6.404, de 1976, adotar o regime de competência, de modo que, mesmo que não tenham sido financeiramente realizados, esses lucros compõem o resultado da pessoa jurídica investidora. Há, portanto, a disponibilidade econômica da renda, fato gerador do IRPJ e da CSLL.

20.  É importante destacar que após serem financeiramente disponíveis para investidora, através do pagamento de dividendos, os lucros das investidas não comporão novamente o lucro da investidora, pois será feito um lançamento contábil, meramente permutativo, a crédito da conta investimentos e a débito de conta classificada no disponível, sem transitar, assim, pelo resultado contábil ou fiscal da investidora.

21.  Há, ainda, a possibilidade de compensar o imposto pago no exterior com o IRPJ e a CSLL devidos no Brasil sobre a mesma base de cálculo (os lucros auferidos por investidas no exterior), independentemente da existência de tratados para evitar a dupla tributação, segundo o art. 26 da Lei nº 9.249, de 1995. Assim, só haverá imposto a pagar se a alíquota adotada na jurisdição for inferior à adotada no Brasil.

22.  Cabe alertar que o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADIN) nº 2.588, declarou, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, que a regra prevista no caput do art. 74 da MP nº 2.158­35, de 2001:

a) se aplica às controladas situadas em países considerados paraísos fiscais; e

b) não se aplica às coligadas localizadas em países sem tributação favorecida.

22.1.  O resultado e os efeitos da ADIN nº 2.588 podem ser resumidos no quadro abaixo:

Investida

Localização

Art. 74 da MP 2.158­35Eficácia erga omnes e efeito vinculante
ColigadasPaís SEM tributação favorecidaInconstitucionalSim
 País COM tributação favorecidaConstitucional (Não alcançada a maioria)Não
ControladaPaís SEM tributação favorecidaConstitucional (Não alcançada a maioria)Não
 País COM tributação favorecidaConstitucionalSim

Sobre a compatibilidade do art. 74 da MP nº 2.1587­35, de 2001, com as disposições dos acordos para evitar a dupla tributação 23. Convém observar que os resultados auferidos em países com os quais o Brasil possui acordos para evitar a dupla tributação são objeto de regras especiais dispostas nas próprias convenções internacionais. Sobre tal matéria, cumpre lembrar as disposições do art. 98 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional ­ CTN), segundo as quais os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária e serão observadas pela a que lhes sobrevenha.

“Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.”

24.  Entende­se, dessa forma, que as disposições dos acordos para evitar a dupla tributação sobre a renda devem ser aplicadas em detrimento daquelas fixadas pela legislação interna brasileira, mesmo nos casos em que as convenções sejam anteriores à Lei nº 9.249, de 1995, pois a prevalência dos tratados ocorre pelo critério da especialidade e não pelo critério de antiguidade da norma jurídica. Desse modo, os acordos podem ser modificados, denunciados ou revogados somente por mecanismos próprios do Direito dos Tratados.

25.  As convenções internacionais para evitar dupla tributação que seguem o modelo da OCDE trazem uma regra de tributação exclusiva dos lucros disposta no Parágrafo 1 do

Artigo 7, segundo a qual os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente ali situado. Se a empresa exercer suas atividades na forma indicada, seus lucros poderão ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem atribuíveis àquele estabelecimento permanente. Transcreve­se a redação do citado parágrafo:

 “Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado. Se a empresa exercer a sua atividade deste modo, os seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem imputáveis a esse estabelecimento estável.”

26.  Assim, para entender a compatibilidade entre os acordos celebrados pelo Brasil para evitar a dupla tributação que seguem o modelo da OCDE e a legislação sobre a tributação de lucros de controladas e coligadas no exterior, é importante destacar o Comentário da própria OCDE sobre o Parágrafo 1º do Artigo 7 da Convenção Modelo (tradução livre):

“ 10.1 O propósito do §1º é traçar limites ao direito de um Estado Contratante tributar os lucros de empresas situadas em outro Estado Contratante. O parágrafo não limita o direito de um Estado Contratante tributar seus residentes com base nos dispositivos relativos a sociedades controladas no exterior encontradas em sua legislação interna, ainda que tal tributo, imposto a esses residentes, possa ser computado em relação à parte dos lucros de uma empresa residente em outro Estado Contratante atribuída à participação desses residentes nessa empresa. O tributo assim imposto por um Estado sobre seus próprios residentes não reduz os lucros da empresa de outro Estado e não se pode dizer, portanto, que teve por objeto tais lucros.”

27.  Conforme exposto pela OCDE, não seriam os lucros da sociedade investida tributados pelo Estado de residência dos sócios, mas os lucros auferidos pelos próprios sócios, em que pese na apuração da base de cálculo tributável seja utilizado como referência o valor dos lucros auferidos pela sociedade sediada no outro Estado. Portanto, o parágrafo 1º não visa  impedir o Estado de residência dos sócios de tributar a renda obtida por intermédio de sua participação em sociedades domiciliadas no exterior.

28.  O art. 74 da MP nº 2.158­35, de 2001, prevê a tributação da renda dos sócios brasileiros decorrente de sua participação em empresas domiciliadas no exterior. Ou seja, a norma interna incide em contribuinte brasileiro, não gerando qualquer conflito com os dispositivos do tratado que versam sobre a tributação de lucros.

29.  É certo que a função primordial dos tratados é promover, mediante a eliminação da dupla tributação, as trocas de bens e serviços e a movimentação de capitais e pessoas. Esse objetivo é igualmente alcançado uma vez que o art. 26 da Lei nº 9.249, de 1995, autoriza a compensação dos tributos pagos no exterior, na hipótese de reconhecimento de lucros, rendimentos e ganhos de capital computados no lucro real. Portanto, a aplicação da norma interna brasileira não acarreta a bitributação econômica dos lucros decorrentes de investimentos no exterior.

30.  Além disso, é importante ressaltar que, segundo o Comitê de Assuntos Fiscais da OCDE, os acordos para evitar dupla tributação também têm por escopo a prevenção da elisão e evasão fiscal, já que os contribuintes poderiam ser tentados a abusar da legislação fiscal de um Estado, através da exploração das diferenças entre as várias legislações dos países ou jurisdições, de maneira a evitar a dupla não tributação. Transcreve­se, por elucidativo, o parágrafo 7 dos Comentários da Convenção­Modelo:

" 7. O objetivo principal das convenções para evitar a dupla tributação é promover, mediante a eliminação da dupla tributação internacional, o comércio iternacional de bens e serviços, e a circulação de capitais e de pessoas. Também é objetivo das convenções evitar a fraude e evasão fiscal.

7.1 Os contribuintes podem ser tentados a abusar das leis tributárias do Estado, explorando as diferenças entre as legislações dos países ... "

31.  É importante destacar que no âmbito do judiciário, há decisão da Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região quanto à inexistência de conflito entre a norma tributária interna e os acordos para evitar dupla tributação. Reproduz­se abaixo a ementa da decisão:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. LUCROS AUFERIDOS POR EMPRESAS COLIGADAS OU CONTROLADAS SEDIADAS NO EXTERIOR. TRIBUTAÇÃO DOS RESULTADOS POSITIVOS DE EQUIVALÊNCIA PATRIMONIAL DE INVESTIMENTOS NO EXTERIOR. MP Nº 2.158­34/2001 e REEDIÇÕES.

1. O fundamento de validade da alteração introduzida pelo art. 74 da MP nº 2.158­34/2001 decorre da Lei Complementar nº 104/2001, que acrescentou o § 2º ao art. 43 do CTN, estabelecendo que, na hipótese de receita ou rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará a sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto de renda. O fato de o art. 74 da MP remeter ao regulamento a forma como será executada a lei não acarreta violação ao princípio da legalidade.

2. Não há qualquer ofensa ao conceito de aquisição de renda eleito pela legislação supra transcrita, uma vez que, com a apuração dos lucros na sociedade controlada, a pessoa jurídica controladora adquire imediatamente a disponibilidade econômica da renda que se incorpora em seu patrimônio, acrescentando­lhe valor. Adquire, ainda, a disponibilidade jurídica da renda, pois terá título jurídico para pleitear e defender o direito relativo a essa renda, de modo que não há como sustentar que a apuração de lucro na sociedade controlada tem reflexos imediatos no patrimônio da controladora.

3. Na sistemática da Lei nº 6.404/76, o lucro da sociedade controlada já deveria ser registrado no balanço patrimonial da sociedade controladora (art. 248, III, alínea ∙a­), chamado de método de equivalência patrimonial, método contábil utilizado na apuração dos lucros dos investimentos relevantes de coligadas ou controladas, cuja aplicação é obrigatória para todas as pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real e que realizem tais espécies de investimento.

4. Logo, com relação à tributação, a lei pode, de forma absolutamente legítima, estabelecer os critérios quanto ao que seja a disponibilidade do lucro e o momento em que pode ser considerada essa disponibilidade.

5. A ADI 2.588­DF, em julgamento no STF discute a inconstitucionalidade do art. 74, parágrafo único da MP 2.158­35/2001 e do parágrafo 2º do art. 43 do Código Tributário Nacional, este último acrescentado pela LC 104/00. O voto vista proferido pelo Ministro Nelson Jobim: aponta a gênese legal do regime tributário criado pela MP nº 2.158­35/2001 (que adota o regime contábil de competência, e não o de caixa); historia a substituição da regra de cobrança do IRPJ do sistema territorial para o sistema de tributação em bases universais (TBU), aperfeiçoado pela LC 104/2001, que permitiu à MP 2.158­34/01 estender às empresas coligadas e controladas tratamento idêntico ao que era dispensado às filiais e sucursais desde 1997; ressalta, quanto ao TBU, a utilização no Brasil da regra de compensação do IR pago pela investida estrangeira; considera irrelevante a questão sobre o controle que a empresa brasileira exerça sobre estrangeira, em razão dos benefícios decorrentes da repercussão, no mercado, do acréscimo patrimonial, expresso no balanço.

6. Inexiste violação aos tratados internacionais para evitar a dupla tributação, que adotam como parâmetro a Convenção Modelo da OCDE, que dispõe: ∙os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só são tributáveis nesse Estado­, uma vez que esta hipótese trata da competência tributária exclusiva do Estado onde estiver sediada empresa controlada quanto aos resultados por ela produzidos.

7. Na hipótese dos autos, a situação é diversa, ou seja, versa sobre a possibilidade de o Estado Brasileiro tributar o lucro auferido no exterior por empresa brasileira. Vale dizer, a União pode exigir o imposto de renda sobre os lucros que empresas brasileiras auferem no território nacional ou no exterior.

Mas não pode exigir imposto de renda sobre os resultados obtidos pela empresa controlada sediada no exterior. Destarte, a regra do tratado e o art. 98 do CTN são inaplicáveis ao caso.

8. Apelação conhecida e improvida.’ (grifei)

32.  É importante destacar contudo que, quando um Estado Contratante opta por abrir mão de tributar o seu próprio residente, ele o faz expressamente nos acordos, como se verifica em algumas convenções internacionais assinadas pelo Brasil, a exemplo dos tratados celebrados com a Dinamarca (Decreto nº 75.106, de 20 de dezembro de 1974.) e com as Repúblicas Tcheca e Eslovaca (Decreto nº 43, de 25 de fevereiro de 1991), em que foi estabelecida cláusula mediante a qual não são tributáveis os lucros não distribuídos:

“ARTIGO 23

Métodos para eliminar a dupla tributação

5. Os lucros não distribuídos de uma sociedade anônima de um Estado Contratante cujo capital pertencer ou for controlado, total ou parcialmente, direta ou indiretamente, por um ou mais residentes de outro Estado Contratante não são tributáveis no último Estado.”

33.  Desse modo, tais acordos impedem que haja tributação no Brasil dos lucros de controladas e coligadas constituídas sob a forma de sociedade anônima, enquanto não efetivamente distribuídos à investidora brasileira.

Conclusão

34.  Em face do exposto, conclui­se que a aplicação do disposto no art. 74 da MP nº 2.158­35, de 2001, não viola os tratados internacionais para evitar a dupla tributação pelas seguintes razões:

34.1.  a norma interna incide sobre o contribuinte brasileiro, inexistindo qualquer conflito com os dispositivos do tratado que versam sobre a tributação de lucros;

34.2.  o Brasil não está tributando os lucros da sociedade domiciliada no exterior, mas sim os lucros auferidos pelos próprios sócios brasileiros; e

34.3.  a legislação brasileira permite à empresa investidora no Brasil o direito de compensar o imposto pago no exterior, ficando, assim, eliminada a dupla tributação, independentemente da existência de tratado.

À consideração superior.

FLÁVIO TEIXEIRA BARBOSA

Auditor­Fiscal da Receita Federal do Brasil

De acordo. À consideração do Coordenador­Geral da Cosit.

CLÁUDIA LÚCIA PIMENTEL MARTINS DA SILVA

Coordenadora da Cotir

Aprovo a Solução de Consulta Interna. Publique­se na internet e divulgue­se nos termos da Ordem de Serviço Cosit nº 1, de 8 de abril de 2013.

FERNANDO MOMBELLI

Coordenador­Geral da Cosit