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Um dia, quem sabe...

Casa própria, plano de saúde e segurança financeira. O sonho do brasileiro envolve planos pessoais, e não projetos nacionais. Saiba o que as marcas têm a ver com isso

 No ar a partir do domingo 4, uma grande campanha de mídia deve invadir os lares dos brasileiros. Através de anúncios de tevê, revistas e jornais e pela internet, a bandeira de cartões Elo buscará, mais do que se tornar uma marca massificada e amplamente reconhecida pela população, estimular uma identificação dos brasileiros com os seus valores, como forma de se diferenciar dos seus rivais, as gigantes internacionais Visa e Mastercard. A empresa, criada em 2011 em parceria pelo Banco do Brasil, Bradesco e Caixa, três das mais poderosas instituições financeiras do País, pretende reforçar o fato de ser uma companhia 100% nacional, adotando o slogan soubrasileiro, que norteará todas as suas campanhas até o fim do ano.

“A Elo é uma startup. Vamos construir a mensagem de que somos brasileiros e que podemos ajudar as pessoas a atingirem seus desejos no dia a dia”, afirma o diretor de comunicação e marketing Luis Cássio de Oliveira, executivo conhecido no mercado por passagens por Citibank e Mastercard, recrutado há um mês na rival Visa. “Para conseguirmos isso, estamos fazendo pesquisas para conhecer as necessidades, aspirações, sonhos e desejos do brasileiro.” Essas mesmas descobertas que a Elo tem buscado foram objetos de um estudo apresentado na sexta-feira 25, durante o evento As Marcas Mais Valiosas do Brasil em 2014, realizado pela BrandAnalytics e pela DINHEIRO.

No evento – que premiou a Skol como a marca mais valiosa e o Google como a mais forte do País –, o grupo britânico de mídia WPP divulgou uma pesquisa global que mostrava a relação entre os sonhos pessoais de brasileiros, americanos, chineses e ingleses com os sonhos de suas nações. O famoso sonho americano, por exemplo, é bem conhecido tanto dentro do país quanto globalmente: os valores de trabalho duro para se atingir destaque social e econômico se espalharam pelo mundo junto com a iconografia propagada por ícones como Coca-Cola, McDonald’s e outras grandes empresas no período do pós-guerra.

Já o sonho chinês passou por grandes mutações nos últimos anos, deixando de ser um projeto de governo, para relacionar desenvolvimento econômico com melhoria de bem-estar pessoal. Quanto aos sonhos brasileiros e britânicos, eles se provaram muito pouco definidos e até mesmo desconhecidos das próprias populações de seus países, diz David Roth, coordenador da pesquisa e CEO da The Store, consultoria de marketing do grupo WPP. Apenas 8% dos brasileiros afirmaram conhecer bem ou muito bem o sonho brasileiro, enquanto chineses e americanos disseram o mesmo em 54% e 43%, respectivamente, quando perguntados sobre os seus países.

Aqui, também houve uma confusão maior na diferenciação entre sonhos da nação e desejos pessoais. Para 59% dos entrevistados, o sonho brasileiro é ter casa própria e, para 56%, segurança financeira e uma boa vida para a família. O menos importante seria ficar famoso (78%) e ver o País ser poderoso (62%). “A percepção é de que o sonho brasileiro tem muita relação com estar mais seguro e ter boas perspectivas para o futuro”, diz Roth. “Mas não com imaginar o Brasil como um país que se posiciona como uma potência emergente. O sonho brasileiro está mais confinado ao individual do que o sonho chinês.”

Mas que impacto essas conclusões podem ter para as marcas? Como indica o interesse da Elo na busca por respostas, não há como alcançar uma identificação com o consumidor sem antes conhecer os seus desejos. Por isso, para as empresas brasileiras, é importante descobrir como ter ressonância com o seu público-alvo. Já, para as estrangeiras, não basta importar planos de marketing. O que funciona no Exterior pode não servir para se comunicar com o brasileiro. Hoje, a percepção das qualidades dos produtos das empresas está muito relacionada às estratégias e ao posicionamento da marca.

“Antes, nos preocupávamos com a disponibilidade, depois com preço, qualidade e marca”, afirmou Oscar Yuan, vice-presidente da consultoria de mercado Millward Brown. “Agora é preciso enquadrar a proposta em uma figura maior.” A Harley-Davidson, exemplificou Yuan, atualmente é mais comprada por pessoas que não utilizam motos diariamente. Sua imagem, baseada na lembrança dos motoqueiros transgressores do filme-marco da contracultura Sem Destino (1969), atrai por conta do conceito de liberdade e rebeldia. Essa maior relevância é o que a paranaense O Boticário vem construindo nos últimos anos. “Estamos em busca de um significado que transcende o produto”, diz Ana Ferrell, diretora de marca e comunicação da fabricante de cosméticos.

“Em nossa estratégia, tentamos resgatar valores humanos, de sinceridade. Dessa forma, não buscamos o resultado de curto prazo e a qualquer custo.” Outro exemplo está no Google, vencedor do prêmio de marca mais forte do Brasil em 2014, no ranking DINHEIRO/BrandAnalytics. “Nosso negócio é tecnologia, mas é muito difícil fazer marketing de código de desenvolvimento”, afirma Flávia Simon, diretora de marketing do Google Brasil. “Ninguém quer saber quanto tempo levou para criarmos uma tecnologia, então o nosso trabalho é simplificar ao máximo o benefício da inovação.”

Isso se traduz, por exemplo, na criação de um vídeo que mostra as pessoas filmando momentos de suas vidas com o Google Glass, os óculos conectados à internet criados pela empresa. As estratégias, de fato, precisam se tornar cada vez mais sofisticadas, para atender consumidores mais exigentes e cientes de seus direitos. “O consumidor evoluiu”, diz Fabio Baracho, diretor de marketing da Skol, a cerveja da Ambev reeleita a marca mais valiosa do País. “As pessoas estão mais ricas culturalmente e exigem mais.”

Se, então, a pesquisa da WPP mostra que os desejos do brasileiro estão descolados de um sonho de Nação, isso se torna um problema para quem busca relacionar sua marca ao aumento de importância do País no cenário mundial ou a um grande evento. A BRF, patrocinadora da Copa do Mundo com a marca Sadia, evitou um apoio simples ao torneio ao optar por fazer uma proposta simpática. Na campanha “Joga pra Mim”, a empresa escalou crianças que pedem para os jogadores da Seleção Brasileira ganharem a Copa do Mundo para elas, que não tiveram a oportunidade de assistir à conquista de um título mundial.


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