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Tributaristas ainda têm dúvidas em relação a MP 449

Alessandro CristoPerdão de dívidas vencidas, parcelamento de débitos em até 120 meses com abatimento de acréscimos, re-parcelamento de saldos de acordos anteriores ainda não quitados. Presente tributário de Natal do governo federal? Não é bem assim, pelo menos para alguns tributaristas que avaliam as concessões feitas pela Medida Provisória 449, publicada no dia 4 de dezembro no Diário Oficial da União. Para eles, ao criar barreiras para as empresas aderirem aos benefícios, o governo impediu a efetividade da medida.O pacote tributário da Presidência da República foi comemorado pelas empresas principalmente no que se refere ao Regime Tributário de Transição (RTT), que teve o objetivo de blindar provisoriamente as optantes pelo regime do lucro real dos impactos fiscais que a Lei 11.638/07 causaria. A MP obriga companhias abertas e as fechadas de grande porte a adotarem os padrões internacionais de contabilização. O RTT será optativo para 2008 e 2009, até que uma lei regulamente a matéria. Se isso não acontecer, o regime passa a ser obrigatório em 2010.Mas o fisco aproveitou a medida também para tratar de contribuintes devedores, concedendo parcelamento especial para débitos de baixos valores e desistindo de cobrar dívidas antigas. A norma perdoou débitos consolidados de até R$ 10 mil, que no dia 31 de dezembro de 2007 já estavam vencidos há pelo menos cinco anos, e permitiu o parcelamento em até 120 meses dos vencidos depois dessa data. Abriu também a possibilidade de re-parcelamento de saldos não pagos de antigas negociações, como o Refis e o Paes. Além disso, permitiu — aí sem imposição de teto — o parcelamento de dívidas causadas pela utilização de créditos de IPI de insumos não tributados ou com alíquota zero, que já têm jurisprudência pacificada favorável ao fisco nos tribunais superiores. É aí que começam os questionamentos.Como muitos desses créditos são discutidos na Justiça, as empresas teriam que desistir das ações para poderem aderir ao parcelamento. A questão é se essa condição é vantajosa para as indústrias, já que muitas dessas ações requerem, em um só processo, o aproveitamento de créditos de IPI não tributado, de alíquota zero e isentos — estes últimos ainda em debate nos tribunais.Como a MP permitiu somente o parcelamento de créditos de IPI não tributado e de alíquota zero, aceitar o benefício obrigaria as empresas a fazerem desistências “parciais”, de forma a poderem continuar discutindo o aproveitamento de créditos de IPI isento. Para as indústrias, a discussão é fundamental, já que a maior parte dos custos de produção é com insumos, cujos créditos de IPI na aquisição reduzem o montante do imposto a ser pago na saída dos manufaturados. Cada tipo de insumo tem benefícios diferentes em relação ao IPI, como os minerais, os derivados de petróleo e os in natura usados na fabricação de alimentos.Em seminário realizado na quinta-feira (18/12) em São Paulo, o advogado Jorge Henrique Zaninetti, do escritório TozziniFreire Advogados, afirmou achar remota a possibilidade de desistência parcial. “Haveria dificuldade inclusive em relação à conversão de depósitos judiciais em receitas da União no momento da desistência. O processo é único, a conta judicial é única, até a guia de depósito é uma só. Quem não conseguir desmembrar pode nem entrar no parcelamento”, disse.A questão, segundo o tributarista Sérgio André Rocha, do Barbosa, Mussnich & Aragão Advogados, só deve mesmo ser definida depois que a MP for regulamentada por ato normativo da Receita Federal e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, ainda a ser editado. “Mas podem vir mais maldades”, reclama Zaninetti.O advogado destaca que as empresas devem calcular o impacto da adesão no fluxo de caixa, já que dívidas com o tributo entre junho de 2008 e março de 2009 — prazo final para optar pelo benefício — terão de ser pagas integralmente. O peso no caixa das indústrias é ainda maior levando-se em conta a entrada determinada pelo governo. Para dividir o montante devido em 120 meses, a primeira parcela a ser paga deve equivaler a 30% do total. A outra opção é pagar três parcelas em cada um dos 12 primeiros meses após a adesão.Depósitos judiciais poderão ser usados nesse sentido, mas não terão os benefícios do pagamento à vista — determinados como abatimento de 100% das multas, 30% dos juros de mora e 100% dos encargos legais, como honorários de sucumbência. “Quem fez depósito judicial acabou sendo prejudicado em relação a quem não fez”, afirmou.Benefícios reaisMudanças de alguns procedimentos fiscais empolgaram os advogados. O reconhecimento da prescrição para a cobrança de tributos, por exemplo, poderá ser feita de ofício pelas Delegacias da Receita Federal e não dependerá mais de demorados processos burocráticos, conforme estabelece a MP.Também agradou a possibilidade de o fisco lavrar um único auto de infração para tributos diferentes. Segundo o advogado Dalton Miranda, da unidade de Brasília do TozziniFreire, a mudança deve beneficiar o contribuinte que teve imunidade tributária cassada e recorre no Conselho de Contribuintes — órgão administrativo da Receita Federal que julga recursos questionando autuações do fisco.O motivo é a divergência de entendimento entre o 1ª Conselho, que julga questões de Imposto de Renda, e o 2º, responsável por discussões sobre impostos indiretos, como a Cofins, por exemplo. O 1º Conselho costuma julgar as cassações de imunidade de forma favorável ao contribuinte, por entender que o atendimento ao artigo 14 do Código Tributário Nacional basta para se usufruir da imunidade tributária garantida a entidades de ensino e de saúde, por exemplo. A norma exige que as instituições não distribuam lucros, apliquem verbas somente no país e mantenham escrituração contábil de receitas e despesas.Já o 2º Conselho entende que, para a imunidade de tributos, as entidades têm que obedecer ao que regulamenta a Lei 8.212/91 — que disciplina o recolhimento de PIS e Cofins. A lei prevê, no artigo 55, que só terão benefício as instituições de utilidade pública que promovam assistência social gratuita, não remunerem diretores e sócios e reportem suas atividades à Previdência Social. A exigência mais rigorosa geralmente prejudica os contribuintes.“Com a unificação dos autos, os atos declaratórios de cassação de imunidade seriam remetidos ao 1º Conselho, já que o IRPJ tem prevalência sobre os demais tributos”, afirma Miranda. As entidades seriam, assim, beneficiadas com exigências mais brandas para as imunidades.Conselho de ContribuintesOutra mudança importante trazida pela MP e destacada pelos advogados é a extinção do Conselho de Contribuintes da Receita Federal, tribunal administrativo composto por representantes do fisco e dos contribuintes. Em seu lugar, foi criado o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, mais enxuto que o atual. Hoje, o órgão máximo do conselho, o Conselho Pleno, por exemplo, é composto por 34 membros, que são os presidentes das câmaras de julgamento das três subdivisões do conselho principal. O pleno do novo conselho, por sua vez, terá apenas 12 cadeiras.A jurisprudência e as súmulas dos atuais conselhos permanecem, de acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, o que garante os entendimentos que já estão valendo. Segundo o advogado Dalton Miranda, que também é integrante da 3ª Câmara do 2º Conselho de Contribuintes, novas súmulas só deverão ser editadas dentro de dois anos, já que o novo órgão depende da edição de um regimento interno e da pacificação de entendimentos das novas turmas. Boa parte dos atuais conselheiros tem mandato a vencer no fim deste mês e não se sabe qual será a nova formação. Os representantes dos contribuintes são indicados por confederações e os do fisco, pela Fazenda.A MP não especificou quais serão os critérios para escolher os representantes do fisco. Pelo regimento atual do conselho, somente auditores fiscais de carreira podem ser indicados. Alguns advogados temem que a expressão “representantes” do fisco mencionada na MP permita que procuradores da Fazenda possam agora integrar o órgão. A explicação para o receio é que são os procuradores que defendem o fisco no conselho atual, o que poderia afetar a imparcialidade das decisões. “Se já era difícil para as empresas, agora vai ficar ainda mais”, considera Miranda.Para Sérgio André Rocha, um procurador na função de julgador tenderia a ser imparcial, mas esse tipo de indicação não deve ocorrer. “Ficaria muito estranho dois membros da PGFN se defrontarem no conselho, um como julgador e outro representando o fisco”, diz. De acordo com a assessoria de imprensa da PGFN, somente auditores serão indicados como conselheiros, como acontece hoje, o que deve ser confirmado com a edição do novo regimento.O anseio da maioria dos doutrinadores tributários, no entanto, não foi atendido. O novo conselho continuará não apreciando matérias que aleguem inconstitucionalidade de leis e atos infra-legais, exatamente como acontece no Conselho de Contribuintes. A mudança é defendida por doutrinas como a do jurista Alberto Xavier, que defende que a Constituição Federal deve prevalecer sobre a lei nos julgamentos pelos tribunais administrativos. Para Sérgio Rocha, porém, apenas o Judiciário deve analisar essas questões, para não comprometer a segurança jurídica. “Deve-se presumir sempre que as leis são constitucionais”, diz.O tributarista lembra, contudo, que já houve avanço nesse sentido no ano passado. Antes, o Conselho de Contribuintes desconsiderava qualquer argumento baseado na inconstitucionalidade de determinada lei, ainda que ela tivesse sido declarada inconstitucional pelo Judiciário. “Hoje, essas discussões já são admitidas quando o Plenário do Supremo Tribunal Federal determina a inconstitucionalidade de uma norma”, afirma.


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